www.sabado.ptFlash - 19 jul. 05:30

O paraíso da impunidade

O paraíso da impunidade

Corremos o risco de uma recessão de décadas com as ideias que umas senhoras advogadas do PSD querem impor a Rui Rio, como se fossem a última Coca-Cola do deserto em matéria de justiça

Portugal costuma ser celebrado na retórica do optimismo político como um pequeno paraíso onde, apesar das dificuldades, se vive com sossego, sol o ano quase todo e uma relativa estabilidade salarial que resulta da acumulação de salário e pequenos biscates. Não deixa de ser uma versão dos pobretes mas alegretes do salazarismo ancestral, mas é, ainda assim, uma verdade objectiva. Realmente, não estando no pelotão da frente do crescimento económico, da inovação tecnológica, das condições de saúde e ensino, Portugal não deixa de ser um País onde se vive bem e onde existem muitas coisas boas, que nem os níveis brutais de corrupção, tráfico de influências, promiscuidade entre o público e o privado, e abuso de poder conseguem liquidar.

Como não seria este País se conseguisse fazer justiça em tempo útil e tivesse um eficaz regime de confisco de bens usados no crime!? Se tivesse conseguido evitar a destruição da PT tal como ela é descrita nesta edição da Sábado, ou seja, uma espiral suicida de negociatas envolvendo Ricardo Salgado, José Sócrates e todos os seus empregados, de Bava e Granadeiro a todos os outros administradores que lá estavam!?

O que não seria este País, em benefício de todos os portugueses e não apenas de alguns, se não fosse arrastado para o pântano da lentidão judicial de cada vez que cai gente com dinheiro nas malhas da justiça!? Se conseguisse evitar a sagração da impunidade em casos como o de Armando Vara e Duarte Lima, condenados em todas as instâncias mas que, mesmo assim, conseguem ir evitando a prisão sem que alguém se indigne, o que não seria deste belo País!? Recorde-se, aliás, que estes são apenas os rostos mais recentes dessa impunidade que já faz parte da genética do regime. Para trás ficam todos os Oliveira Costa desta vida. Mas para a frente prevê-se o pior. Ricardo Salgado alguma vez será julgado por um dos muitos processos que tem? Provavelmente não.

A justiça mudou mas não o suficiente para enfrentar em simultâneo, com celeridade e eficácia, casos da dimensão dos de Sócrates, Salgado, Portugal Telecom e toda a tralha que corre pelos tribunais. Ninguém discute com verdade e coragem, como um problema político de primeira magnitude, a necessidade de reforço de meios técnicos e humanos da investigação criminal. Pior: corremos o risco de uma recessão de décadas com as ideias que umas senhoras advogadas do PSD querem impor ao dr. Rio como se fossem a última Coca-Cola do deserto em matéria de justiça.

Se quiserem ser sérios enfrentem os problemas da impunidade de quem tem dinheiro para fazer a justiça resplandecer para os próprios a partir de muitos dígitos e não venham com as habituais tretas dos falsos garantistas. Não existem regimes perfeitos e erros podem sempre acontecer. Mas alguém acredita que o sistema de justiça que temos não assegure todas as garantias de defesa a um cidadão!? Se o PS compra esta tralha teremos um Bloco Central no pior sítio onde ele pode existir, que é a justiça. E se isso acontecer é melhor pedirmos todos asilo político a Espanha porque isso é a construção definitiva do paraíso da impunidade para os clientes dos grandes escritórios de advogados.

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