observador.ptobservador.pt - 19 mar. 18:23

Jean-Pierre e Bernadette estão casados há 47 anos. Ele está em coma profundo há 36

Jean-Pierre e Bernadette estão casados há 47 anos. Ele está em coma profundo há 36

Jean-Pierre Adams tem 70 anos e é casado com Bernadette há 47. O antigo jogador do Nice e do PSG está em coma desde 1982. A mulher só tem um receio: "E se eu morrer antes dele?".

Jean-Pierre Adams fez 70 anos no dia 10 de março. É casado com Bernadette Adams há 47 anos e juntos têm dois filhos, Laurent and Frédéric. Jean-Pierre nasceu no Senegal e cresceu em França, tornando-se jogador de futebol profissional e até internacional pela seleção francesa. Até aqui, tudo parece normal. Mas esta não é uma simples história de um antigo jogador de futebol: Jean-Pierre Adams está em coma há 36 anos. Desde 1982.

Tudo não passava de uma cirurgia a uma aborrecida e incapacitante lesão no joelho. Jean-Pierre tinha sido defesa central do Nimes, do Nice e do Paris Saint-Germain — chegou a ficar duas vezes no segundo lugar do campeonato francês — e em 1981, com 33 anos, decidiu retirar-se para treinar camadas jovens. Em março de 1982, partiu para um curso intensivo de três dias, em Dijon, para aspirantes a treinador de futebol. Foi lá que lesionou um tendão no joelho. 

Regressado a Lyon, deslocou-se ao Hospital Édouard Herriot para fazer um raio-x. Bernadette, a mulher, contou à CNN que o programado era Jean-Pierre fazer o exame e ir para casa. Mas, num dos corredores do hospital, encontrou um médico especializado em lesões relacionadas com o futebol — à altura, era o médico do Lyon. O cirurgião prontamente se ofereceu para ajudar e depois de uma consulta rápida, marcou a operação.

17 de março de 1982. Foi o dia da cirurgia de Jean-Pierre, que marcou o princípio do pesadelo para a família Adams. Foi também o dia de uma greve de todo o staff do Hospital Édouard Herriot, um pormenor terá sido determinante.

A anestesista estava a cuidar de oito pacientes, um a seguir ao outro. O Jean-Pierre foi supervisionado por um interno, que estava a repetir o ano, que mais tarde admitiu em tribunal que não estava à altura daquela tarefa. Dado que não era uma operação vital, e que o hospital estava em greve, faltavam médicos e esta mulher estava a cuidar de oito pacientes. Deviam ter-me ligado a dizer que iam adiar a operação”, recorda Bernadette Adams, que conheceu o futuro marido durante o agitado maio de 68.

Mas ninguém ligou. Jean-Pierre foi mal entubado, com um dos tubos a bloquear a entrada do ar nos pulmões, ao invés de os ventilar. O antigo jogador de futebol ficou privado de oxigénio e acabou por entrar em paragem cardiorrespiratória. Entrou em coma e assim continua, 36 anos depois. Bernadette foi chamada ao hospital e só saiu de lá, em conjunto com o marido, 15 meses depois. Nessa altura, foi aconselhada a internar Jean-Pierre num lar de idosos. Mas não seguiu o conselho.

“Não achei que eles soubessem cuidar dele por isso disse a mim mesma: ‘Ele vem para casa’. E tomei conta dele desde aí”, conta a francesa. O antigo jogador do PSG consegue respirar sozinho, digerir a comida e abrir e fechar os olhos. Mas é incapaz de qualquer movimento voluntário. Bernadette dá banho, faz a barba e veste Jean-Pierre sozinha todos os dias. Continua a oferecer-lhe prendas no aniversário e no Dia do Pai: “Lençóis ou roupa, porque ele muda de roupa todos os dias”. Nas raras ocasiões em que passa a noite fora de casa, garante que o marido sente a sua falta.

Ele sente se não sou eu a dar-lhe de comer e a cuidar dele. As enfermeiras dizem-me que ele não é o mesmo. Eu acho que ele sente coisas. Deve reconhecer o som da minha voz”, contou Bernadette à CNN.

Jean-Pierre é a ocupação a tempo inteiro de Bernadette, para quem é impossível ter um trabalho e ganhar dinheiro. Travou uma luta de 12 anos com a justiça francesa para obter um subsídio que os sustentasse e, durante esse tempo, foi ajudada pela Federação Francesa de Futebol e pela associação que apoia antigos jogadores. Em 1989, sete anos depois da operação, os funcionários do hospital foram condenados por negligência: as sanções foram um mês de suspensão e 750 euros de multa.

Com o passar dos anos – e sem ponderar a hipótese de eutanásia – a preocupação de Bernadette é apenas uma: “E se eu morrer antes dele?”.

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