www.jn.ptAfonso Camões - 18 mar. 00:02

A minha é maior que a tua

A minha é maior que a tua

Há infiltrações nos sistemas inimigos, espiões envenenados, expulsão de diplomatas, retaliações, ameaças, escalada armamentista, quase tudo como nos filmes do 007, nos anos da Guerra Fria. Mas agora com eleições.

Para os milhões de russos que hoje vão a votos, a questão não é saber quem ganha, mas por quantos. E logo à primeira volta. Há 18 anos no poder, alternando entre presidente e primeiro-ministro, Vladimir Putin vai para um novo mandato presidencial, numa eleição cuja maior curiosidade é se fica acima ou abaixo dos 63,6% que arrecadou há seis anos. Para muitos dos seus, e em particular para os meios de comunicação que o servem, Putin é o super-herói que foi capaz de recuperar a Crimeia para a Mãe Rússia, enfrentar a impertinência dos novos líderes ocidentais, forçar a intervenção na Síria, retomar a iniciativa no plano internacional e, em suma, restaurar o orgulho perdido com a implosão da União Soviética.

Consciente de que a economia do país não é o seu forte, o antigo espião do KGB ambiciona recuperar o espaço geopolítico ocupado pelas 15 repúblicas para lá da antiga Cortina de Ferro. E recorda, amiúde, "a perda de um quarto do território, quase metade da população, 41% do PIB e boa parte do seu potencial militar. Daí que tenha conduzido a campanha eleitoral, longe do confronto de projetos ou candidatos (que o favorito foi tratando de neutralizar ou reduzir à mínima expressão), centrando o discurso na exaltação patriótica do orgulho e da superioridade russos, perante um cenário internacional multipolar e hostil. Daí, também, o teatral anúncio, há dias, de um novo míssil balístico intercontinental capaz de iludir e contornar os escudos antimísseis ocidentais - enfim, o regresso ao estilo "a minha é maior que a tua", a encenação tradicional nas liturgias da Guerra Fria, agora em versão multipolar. É certo que a indústria de armamento ainda dá trabalho a 2,5 milhões de russos, 3% de todo o emprego e um dos pilares da economia. O problema deles é que os espaventos do Kremlin não resolvem os principais problemas do país, que são de ordem económica e social, com desemprego galopante e mais de 40 milhões (um em cada quatro) no limiar da pobreza.

Em bicos de pés, Putin quer ser ouvido em todo o Mundo. E foi para o Mundo aquele discurso, sem precedentes, sobre a capacidade destrutiva do potencial nuclear da Rússia. É para o levarmos a sério. Até porque, há pouco mais de um ano, deste lado ocidental, aconteceu-nos que um ignorante, narcisista, vulgar, racista e descontrolado como Trump chegou aos comandos do hospício. E, paulatinamente, vamo-nos dando conta de que os principais hospícios são as maiores potências nucleares.

* DIRETOR

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