www.publico.ptopiniao@publico.pt - 17 mar. 03:44

Opinião. O Mar do Inferno é também uma marisqueira exímia em que se pode confiar cegamente

Opinião. O Mar do Inferno é também uma marisqueira exímia em que se pode confiar cegamente

É a melhor e mais completa marisqueira que conheço. Têm sempre todos os mariscos disponíveis no nosso mercado. Isto é dificílimo e tem imensos riscos.

O Mar do Inferno é a melhor e mais completa marisqueira que conheço.

Têm sempre todos os mariscos disponíveis no nosso mercado. Isto é dificílimo e tem imensos riscos, já que o marisco que vende é sempre fresquíssimo.

Tem, por exemplo, magníficos lagostins. Vêm vivíssimos para a mesa antes de serem cozidos com perícia e o sal exacto. Os lagostins sempre foram o marisco mais caro. Lembro-me do primeiro que comi em 1961, tinha eu cinco ou seis anos. Custou 7$50 e eu lembro-me que dava para comprar cinco chocolates Regina dos maiores.

Hoje, os bons lagostins grandes vendem-se por cerca de 150 euros. As poucas casas que têm a sorte de poder comprá-los directamente pagam 90 euros por cada quilo — está visto que o lucro é irrisório. Hoje em dia, oferecer lagostins vivos é uma prova de prestígio, um sinal que se levam a sério os outros mariscos.

A dona Lurdes Toscano é conhecida pelos altos padrões de qualidade. Desde sardinhas a lagostins, rejeita tudo o que não estiver nas melhores condições. No Mar do Inferno pode-se comer marisco à confiança. Se não há um marisco é porque não se apanhou ou porque não prestava.

Mar do Inferno

Av. Rei Humberto II de Itália
Boca do Inferno
Cascais
Tel.: 214 832 218

Um quilo de lagostins custa agora 140 euros o quilo. Isto traduz-se em 10 lagostins de bom tamanho. Um quilo de lagostins é um banquete para duas pessoas. Não há pergunta mais bonita que me possam fazer num restaurante do que esta: “Posso trazer os lagostins quando ficarem prontos?”

Eu cá prefiro abrir os lagostins (e todos os mariscos) com as mãos. É um prazer primário. Afinal, eles são cozidos na água do mar onde vivem: não há outra intervenção ou tempero. É o cúmulo da simplicidade. O mesmo se aplica às nossas mãos. Faz sentido.

Ora, um só lagostim custa à volta de 14 ou 15 euros. Não é uma fortuna e o lagostim é o mesmo. Prometo a mim próprio que, para a próxima, comerei só um e darei graças a Deus.

Os lagostins estavam perfeitos. Têm um sabor delicado, quase ténue. Se os lavagantes são prosa, os lagostins são poesia.

Comi também 200 gramas de verdadeiro camarão de espinho — o espinho refere-se ao apetrecho dos camarões e não à bonita (e ainda camaroeira) cidade de Espinho. O melhor até vem da zona de Viana do Castelo. A época está quase a acabar mas estes estavam gordinhos e suculentos. Lá está: um quilo custa 120 euros mas 200 gramas, por 24 euros, são muitíssimos camarões. A mão-de-obra necessária para comê-los também vai entretendo e levando o seu tempo.

O Mar do Inferno também é famoso por ter quase sempre bruxas boas, um marisco divinal que se dizia extinto mas que se tem aguentado muito bem. Há quem conheça por santiagos. Se quiser abri-los à mão — essencial para não perder o suco — é preciso avisar de antemão.

Um dos sinais mais reveladores de um restaurante sério é a persistência dos empregados de mesa. No Mar do Inferno são os mesmos de sempre. Nada há de mais reconfortante do que reconhecer as pessoas que nos servem. A última vez que lá fomos tivemos a sorte de apanharmos o senhor José Torres, com quem é um prazer conversar. Todos os empregados do Mar do Inferno são de uma simpatia e eficácia extremas. Perdoam facilmente os erros e as hesitações dos clientes, lendariamente mal habituados.

O expositor de mariscos é um lugar perfeito para apreciar a oferta e discuti-la com a dona Lurdes ou com o filho dela que trata dos mariscos, uma fonte de sabedoria, humor e de bom gosto, cujo nome agora me escapa, pelo que peço desculpa.

Claro está que o Mar do Inferno é também um excelente restaurante, com peixe maravilhoso e preços aliciantes. A prova disso é que está sempre cheíssimo. É muito difícil marcar mesa, mesmo nos dias mais calmos da semana. É preciso paciência. A dona Lurdes é eficientíssima mas ainda não sabe fazer milagres. Faz o favor de atender o telefone — o resto é connosco. A melhor maneira é perguntar em que dia é que há uma mesa disponível — e ir lá nesse dia. Marcar para o próprio dia é quase impossível. Mas vale mesmo a pena esperar. Eu que o diga.

NewsItem [
pubDate=2018-03-17 04:44:00.0
, url=https://www.publico.pt/2018/03/17/fugas/opiniao/o-mar-do-inferno-e-tambem-uma-marisqueira-eximia-em-que-se-pode-confiar-cegamente-1806634
, host=www.publico.pt
, wordCount=710
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2018_03_17_1537557829_opiniao-o-mar-do-inferno-e-tambem-uma-marisqueira-eximia-em-que-se-pode-confiar-cegamente
, topics=[opinião]
, sections=[opiniao, vida]
, score=0.000000]