Hugo Veiga - 17 mar. 14:12
Opinião. Pratiquem o 69
Opinião. Pratiquem o 69
Hoje, acordei com esta ideia estapafúrdia: trabalhar seis meses e descansar outros seis. Uma vida, literalmente, feita de 69
Esta história é verídica. Acordei com uma epifanía, pulei da cama, abri o computador e comecei a descrevê-la sob a forma do artigo que estão agora a ler. Sabem, caros leitores, padeço de um mal que me apoquenta faz tanto tempo que acredito ter virado crónico: trabalho demais.
Tenho vivido bem com a doença porque amo o que faço. Mas talvez porque a idade e maturidade começam a pesar, tenho surtos como este, de lucidez.
Se vivo, Freud poderia explicar o fato porque hoje, acordei com esta ideia estapafúrdia: trabalhar 6 meses e descansar outros 6. Uma vida, literalmente, feita de 69 (esclareço quem começou a ler o texto pelas razões erradas que esta é a representação possível com o Word para Yin e Yang, 6 normal e 6 invertido. O quê? Sentem-se enganados? Isto é um artigo de família, pessoal. Sigamos.)
A ideia, pode até já estar gasta em sites e livros de auto-ajuda, mindfulness, ou qualquer nova trend. Mas como não leio, nem pratico nada disso, desculpem – se esse for o caso – o meu entusiasmo.
Aquele, que me fez sair da cama direto para o computador (só nesta frase já vêm como errada está esta minha vida), e elaborar essa ideia de 6/6, ou meio/meio, que passo agora a justificar.
Comecemos por um fato polêmico: dinheiro não traz felicidade. (Eita, que clichezão, Hugo!). Perdão, caro leitor. Mas permita retratar-me. Clichês têm razão de ser: eles são uma síntese de anos de aprendizado humano. E os nossos antecessores, principalmente muitos daqueles que estão aí desde a segunda metade do século XX, deram-se conta que trabalharam pelas razões erradas: o consumismo. Gastamos dinheiro demais em vaidades… inutilidades… quando poderíamos ser muito mais felizes com menos coisas e mais vivências significativas. (lembram do começo do Trainspotting?) Acreditem, não me estou a armar em hippie de Cascais. Prezo e trabalho, como vocês, por uma estabilidade financeira. O que aqui defendo é o equilíbrio. Até que ponto aquela promoção e aquele aumento vão trazer real felicidade? Quantos jantares de amigos serão desmarcados? Quantas discussões o stress irá gerar lá em casa? Quantos momentos você vai perder com os seus filhos? Quanto desse dinheiro não vai para terapias e tratamentos caros? E quanto aquele prato, naquele restaurante caro que agora você pode pagar, vai saber melhor que aquela comidinha de mãe?
Outro ponto para justificar esta ideia de meio/meio é que descanso aumenta a produtividade. No ano passado, o Cristiano Ronaldo foi poupado de muitos jogos para chegar à fase final da Champions atropelando os adversários cansados dos seus campeonatos, taças nacionais e fases de apuramento. Na minha profissão, os projetos exigem sprints constantes e, a atenção aos detalhes, tempo. E como também não faz parte da minha personalidade trabalhar a meio gás, nunca conseguiriam entrar no esquema das 8h por dia, com direito a siesta. Daí, que a ideia que me despertou hoje, parece tão aliciante. Durante 6 meses trabalharia ainda mais do que trabalho hoje. Porque estaria descansado, oxigenado por toda a informação consumida nos outros 6 meses. Estaria mais focado nos projetos em mãos e não me importaria de me esforçar ainda mais por saber que, dali a poucos meses, estaria de férias de novo.
Seria como tipo dupla de WWF onde, após um simples bater da mão, o companheiro entra no ringue para tomar e dar porrada. Mas neste caso, o de fora não ficaria a olhar e sim, dava o fora para morar num lugar com baixo custo de vida onde poderia ler, escrever, fazer cursos on-line, viajar, cuidar do seu corpo e trabalhar em qualquer coisa para dar um dinheiro extra, mas fora da sua profissão. Após 6 meses, voltaria ao ringue, bateria na mão do companheiro e entraria para continuar o serviço.
Esta ideia de 69 é corroborada pela ciência. Tipo a descoberta que exercícios físicos com sprints intensos trazem os mesmos resultados que um exercício prolongado.
Na vida profissional, ela é praticada por algumas celebridades. Como Jason Marz, que lança um álbum, faz um Tour pelo mundo e depois some por 2 anos em viagens de surf e inspiração para o próximo álbum.
Pensem, adorados leitores, um programa como este poderia acabar com o desemprego, aumentar a produtividade, a saúde, a felicidade da população, o problema da sobrelotação das cidades e o impacto negativo do consumismo.
“Ah, falas isso porque não tens as mesmas contas pra pagar que eu” – Com certeza, cada caso é um caso. Mas a ideia de meio/meio busca um equilíbrio. Tanto que o seu meio/meio pode ser 9 meses de trabalho para 3 meses de Descanso (acho que este seria o meu); 8 pra 4; 10 pra 2; 7 pra 5… enfim, é sobre gastar menos dinheiro em bobagens e privilegiar o que é realmente importante.
Como foi um conceito tido num meio sono, talvez seja um meio sonho. Mas escrevam isso: No dia que me tornar presidente da minha vida, irei implementar o programa do meio/meio. E no meu meio/meio não haverão meias palavras. Nem portas entreabertas. O copo meio vazio será o mais cheio. O Inverno terá gosto de Verão e cada semestre, sensação de ano inteiro.
Executive Creative Director do AKQA São Paulo