www.jn.ptRui Sá * - 18 dez. 00:08

Nacionalize-se!

Nacionalize-se!

Passei grande parte da minha vida a ouvir argumentos que diabolizam as empresas nacionalizadas e cantam hossanas aos benefícios das empresas privadas.

Recordo que, quando adolescente, se procurava ridicularizar a "sanha nacionalizadora" pós-25 de Abril, referindo-se que até cabeleireiros tinham sido privatizados - o que até seria verdade, mas pelo simples facto de, pertencendo o seu capital a um banco (por força, creio, de dívidas não pagas), a nacionalização do banco tinha implicado a privatização do... cabeleireiro.

Mais tarde, quando o bloco central já tinha deixado cair dos seus programas as nacionalizações (sim, porque PS e PSD defendiam-nas no pós-25 de Abril!) os argumentos passaram a ser outros, baseando-se na "eficiência" da gestão e no apontar o dedo aos enormes prejuízos das empresas nacionalizadas. Foi a altura em que à frente destas empresas eram colocados gestores com o claro objetivo de as arruinar, contribuindo para a tese da necessidade da sua privatização e, em particular, para a diminuição do seu valor tendo em vista facilitar a sua compra por parte dos grupos económicos (na maior parte dos casos os mesmos que, diziam os opositores das nacionalizações, tinham ficado na "miséria" após as mesmas...). Gestores esses que, em muitos casos, transitavam para as empresas privadas, como prémio pelo seu "desempenho".

Depois veio o "capitalismo popular" com a disseminação do capital das empresas por muitos pequenos acionistas que, na febre de tentarem ganhar dinheiro, muito dinheiro deram a ganhar aos grandes grupos económicos. Chegou-se, assim, aos setores estratégicos (banca, seguros, energia, telecomunicações, transportes, cimentos e diversos serviços). Sacou-se então da cartola a ideia das "golden share", ou seja, o Estado mantinha posições minoritárias nas empresas mas com capacidade de veto em matérias importantes. E assim se reprivatizou a maioria do capital de empresas destes setores, o que ainda tinha o "benefício" de ajudar a compensar o défice...

Mais tarde também as "golden share" foram vendidas. Sendo que, nesta altura, já foi o capital estrangeiro a ficar na posse destes setores estratégicos para o país. Face aos argumentos dos defensores das privatizações, pensava-se que, agora sim, teríamos condições para uma economia próspera, num mercado virtuoso. Logo se viu que não. Os casos BPN, GES, BCP, BANIF, PT, EDP são vergonhas que não estão apenas relacionadas com pessoas sem escrúpulos - a essência emana do sistema económico que alimentam e de que se alimentam.

Fico, assim, contente que esteja na ordem do dia a (re)nacionalização dos CTT e que tal ideia tenha cada vez mais adeptos. É que só o facto de este assunto se discutir significa a falência da velha tese de que o que é público é mau...

* ENGENHEIRO

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