www.cmjornal.ptEditorial CM - 19 out. 01:31

Prevenir para não combater

Prevenir para não combater

Gasta-se mais a combater do que a prevenir os fogos.
A demissão de Constança Urbano de Sousa é o fim de um pesadelo para o País. A Administração Interna está sem liderança praticamente desde que a ministra tomou posse. O último episódio deste patético percurso foi a frase sobre as férias. Ao ousar falar das férias que não teve, no rescaldo de uma horrível tragédia, a professora Constança, como o primeiro-ministro se lhe referiu no Parlamento, ganhou um lugar na memória maldita da nação.

Cantava Camões que o fraco rei faz fraca a forte gente. A inação de Constança alastrou a toda a Proteção Civil. À falta de liderança juntou-se o péssimo planeamento e a sempre medíocre resposta aos alertas meteorológicos sucessivos, num verão particularmente seco.

Tudo isto foi agravado pela tomada de assalto desta estrutura fundamental do Estado por vorazes clientelas partidárias. Mas, se a Proteção Civil carece de uma revolução urgente, é imperioso repensar, também, a ação dos autarcas. Há instrumentos legais suficientes para atuar na área da prevenção, nomeadamente ao nível da posse administrativa de terrenos para executar as necessárias limpezas e os trabalhos urgentes. Os autarcas devem, de uma vez por todas, aplicar as leis existentes, por mais cómodo que seja não confrontar poderes nem interesses instalados.

O relatório da comissão técnica independente traça um retrato cruel: na estrada da morte, a vegetação não estava à distância da faixa de rodagem exigida por lei, 10 metros, o que potenciou ao máximo o risco de incêndio. Ora, cabe às câmaras municipais exigir que todos os proprietários façam as obras necessárias para a salvaguarda da segurança pública. Se os autarcas não o fazem, não podem apontar o dedo a ninguém. Também a falta de dinheiro é um mito que deve ser combatido.

Os negócios milionários da indústria dos fogos mostram que não tem havido falta de dinheiro para acabar, ou minorar, este flagelo. O problema é a distribuição das verbas que se gastam todos os anos.

Gasta-se mais a combater do que a prevenir. Também aqui, o relatório da comissão de sábios traça um retrato claro. O investimento público na prevenção é o único que não sobe desde o ano 2000. Tudo o resto sobe a um ritmo, muitas vezes, bem superior à inflação. Como vemos, a tragédia dos fogos é uma história mal contada, em que, no final, quem perde é sempre Portugal e os portugueses.

António Costa teve tempo para atuar, depois de Pedrógão Grande, mas, também ele, sucumbiu à inação. Inverter este ciclo vicioso é o mínimo que se exige a um primeiro-ministro que queira limpar o peso na consciência, que, ontem, confessou transportar.
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