visao.sapo.ptCapicua - 19 out. 08:34

Esparguete à MEC (e outras iguarias)

Esparguete à MEC (e outras iguarias)

Quem é que sabe quem foi o Brás ou o Zé do Pipo? Quem é que se lembra do Gomes de Sá? Pois, eu também não. Mas, como fui investigar, posso fazer aqui um brilharete

D.R.

O MEC faz esparguete de curgete. Li numa crónica e não resisti ao jogo de palavras. Sugiro até que, a partir de hoje, o esparguete de curgete, devidamente “espiralizado” num dos spiralizers aconselhados por Miguel Esteves Cardoso, passe a chamar-se “esparguete à MEC”, em vez de courgetti (como parece ser tratado). Afinal é uma grande honra para chefes, gourmands, foodies e lambareiros em geral, isto de ser padrinho de batismo de uma receita. Sobretudo se o prato durar anos suficientes para que já ninguém saiba de onde veio o nome e quem foi o homónimo. É sinal que já faz parte da nossa cultura culinária, da nossa memória gustativa e que já ascendeu ao estatuto de coisa-de-toda-a-vida. Ora isso é o mais longe que se pode ir sem sair da cozinha.

No bacalhau acontece muito. Quem é que sabe quem foi o Brás ou o Zé do Pipo? Quem é que se lembra do Gomes de Sá? Pois, eu também não. Mas como fui investigar, posso fazer aqui um brilharete e dizer-vos que o Brás era dono de um tasco no Bairro Alto, que o Zé do Pipo tinha um restaurante no Porto e que o Gomes de Sá era um negociante de bacalhau que, no século XIX, inventou uma receita premiada.

O mesmo aconteceu com o bacalhau à Narcisa, do restaurante com o mesmo nome, que eu ainda cheguei a conhecer em criança. Um daqueles tascos que se foi ampliando de sala em sala e que, sendo tão famoso em Braga, foi responsável pela projeção da cidade num prato de bacalhau! Por isso é que bacalhau frito com cebolada e batata às rodelas, tanto 
é à Narcisa como à Braga ou à Minhota.

Mas, nem só de bacalhau se fazem estas honrarias. Vejamos as sobremesas... Toda a gente conhece o crepe Suzette, mas pouca gente sabe que o nome do crepe, passou a ser “Suzette” depois de já ter sido “do Príncipe”, e que houve uma transmissão de nome, quando Eduardo VII de Inglaterra quis agradar a uma bela senhora, fazendo do crepe seu homónimo.

Ou, por exemplo, a Pavlova, batizada em honra da famosa bailarina russa que, há mais de um século, andava em grandes digressões pelo globo e que, numa passagem pela Nova Zelândia, recebeu a honra de lhe dedicarem uma sobremesa e de ver o seu nome conservado em açúcar para a posteridade (no caso improvável do seu bailado não ser suficiente). Já a Pizza Margherita foi nomeada em homenagem à Rainha Margherita de Savoia, aquando de uma visita a Nápoles. Mas diria que, apesar de ser um clássico intemporal, é um pouco simplezinha demais para uma rainha. Até porque, na esmagadora maioria das pizzarias deste mundo, não se lhe faz jus, sabendo nós que, para a sublime simplicidade da cozinha italiana ser cumprida, os ingredientes têm de ser de suprema qualidade (o que não é de todo o caso na maior parte das vezes). Continuando, podíamos ficar horas enunciando receitas, como o Bife Wellington (cuja história do nome não colhe consenso), a Salada César (que dando a ideia de reportar ao imperador romano, deve o seu nome a um cozinheiro mexicano), ou os americaníssimos Ovos Benedict (que terão nascido numa manhã de ressaca, quando um corretor da bolsa nova-iorquina, Lemuel Benedict, ligou para o room service do Waldorf-Astoria para pedir ovos escalfados com bacon, cobertos de molho holandês, em cima de uma torrada).

Mas acima de todas estas iguarias e com inigualável distinção estão as amêijoas à Bulhão Pato! Sortudo do poeta que ficou com o melhor petisco! Reza a lenda que mencionou o cozinheiro num dos seus escritos e que, em jeito de agradecimento, lhe foi retribuída a simpatia num prato de amêijoas. Se a inveja matasse mais do que a alergia ao marisco, já estaria fulminada! E já que as amêijoas estão ocupadas, se puder escolher, quero dar o meu nome a um sorvete. Dos bons. Assim por exemplo de after-eight (chocolate negro e menta, para comer à colher no sofá em dia de chuva, ou em cone depois de um dia de praia).

Isso mesmo: o MEC será esparguete de curgete e eu serei sorvete (para acabar tudo em rima).

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