www.sabado.ptFlash - 18 out. 01:00

Boas férias, senhora ministra

Boas férias, senhora ministra

Não querendo prejudicar o descanso da senhora ministra, como contribuinte e eleitor só posso desejar-lhe umas boas férias. Quando a sua presença no combate aos incêndios e no Governo já só atrapalha, vá de férias. E não volte que não vale a pena

António Costa tem-se esforçado por ganhar tempo, sacudir a pressão, focar o discurso do Governo nas reformas estruturais da floresta e da protecção civil, empurrar a inépcia e a paralisia para os governos do PSD e, em parte do PS, que nos últimos 10 anos não concretizaram as suas medidas na prevenção e combate dos fogos.

O primeiro-ministro até pode ter razão em algumas coisas mas tudo o que, em momentos cruciais dos últimos dias, se ouviu das bocas da ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, do seu secretário de Estado, Jorge Costa, e do próprio António Costa, só tem um significado no léxico político: arrogância pura e simples. Intolerável arrogância política de quem não governa ainda em maioria absoluta mas que se comporta como se já a tivesse, com o insuportável maniqueísmo moral e político do BE e do PCP a servirem de lastimáveis muletas.

Quando Costa, na noite de domingo, em cima da tragédia vivida pela parte mais desprezada do País e das políticas públicas de esquerda ou de direita, o tal interior que tanto percorre o palavreado da boa consciência dos nossos políticos, basicamente se irrita com as perguntas dos jornalistas, não está à altura do que lhe é exigido pelas circunstâncias: compostura, respeito, humildade, prestação de contas. Aí, Costa não está muito longe do seu correligionário que acha intolerável ser perguntado por um jornalista digno desse nome, Vítor Gonçalves, da RTP, sobre os meios de vida que lhe pagam hoje as contas. Costa, que tanto se distanciou de Sócrates, naquele momento parecia picado pelo vírus da mesma arrogância.

Quando Costa desculpa uma ministra que diz não se importar de ser demitida, porque até ia gozar as férias que não teve até hoje, é porque se revê naquele comportamento idiota e profundamente ofensivo para todos os que morreram em Pedrógão Grande e, agora, um pouco por todo o País.

O mesmo se aplica às inqualificáveis declarações do secretário de Estado Jorge Gomes, na própria noite da tragédia, em que atribuiu uma boa parte das culpas dos fogos às populações que estavam a ser dizimadas por uma tragédia sem nome. Costa, por muito poder que tenha, por muito senhor que seja do xadrez político, por muito esperto que seja na gestão do seu tempo e do seu discurso, não pode irritar-se com perguntas, acusar tudo e todos de não se curvarem perante a excelência das suas obras e decretos e tão-pouco pactuar com a soberba dos seus governantes. Há coisas, por verdadeiras que sejam, que não podem ser ditas em momentos de dor imensa.

A política é uma missão de serviço público que deve ser cumprida com humildade democrática, pedagogia cívica e uma tolerância profundamente enraizada no carácter a todo o tempo e não apenas quando nos convém. Não é coisa de intermitência tacticista mas, pelo rumo que as coisas levam, na geringonça, parece que a cartilha do quero, posso e mando se instalou. Onde está a responsabilidade política? A prestação de contas? O assumir de responsabilidades ditadas pela própria consciência, como fez Jorge Coelho na queda da ponte de Entre-os-Rios?

Numa questão como a dos fogos e as mortes que ele provocou, António Costa pode ter razão na vantagem de procurar soluções estruturais mas não pode meter a cabeça na areia: a sua equipa do MAI é um desastre e não tem qualquer capacidade para protagonizar as mudanças que ele quer fazer. Por isso, não querendo prejudicar o descanso da senhora ministra, como contribuinte e eleitor, a única coisa que lhe posso mesmo desejar, nesta altura em que a sua presença nos fogos e no Governo já só atrapalha, é que vá de férias e não regresse. Que as goze bem, mas que não volte.

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