observador.ptobservador.pt - 22 ago. 14:03

Appetence, a app para namorar que não acredita no amor à primeira vista

Appetence, a app para namorar que não acredita no amor à primeira vista

Na Appetence, só pode ver o aspeto do outro depois de trocarem 100 mensagens. Se a conversa correr bem, ambas as fotografias são reveladas. Mas separar a beleza exterior da interior é mesmo positivo?

Não é outra versão do Tinder com uma estética melhorada, mas antes uma “anti-Tinder”. A Appetence é a aplicação de encontros online para quem quer “levar as coisas com calma”. A diferença face às restantes é simples: nesta aplicação lançada em abril de 2016, a fotografia dos utilizadores é a última coisa a aparecer. E precisa de, pelo menos, uma centena de mensagens trocadas entre duas pessoas para que as fotografias sejam reveladas.

A missão da Appetence é fazer com que os utilizadores utilizem a escrita como arte de sedução. Mas não terão os utilizadores receio de que a pessoa com quem trocaram 100 mensagens — e que descobriram ser bela por dentro — não seja, afinal, tão bonita por fora? Talvez. Mas Lurdes Leal, psicóloga clínica e psicoterapeuta de casais, explica que é mesmo possível que quanto mais acharmos alguém interessante, mais bonita essa pessoa nos vai parecer.

Quando conversamos uns com os outros, desenvolvemos muitas vezes uma atitude favorável, que faz com que descubramos não só a beleza interior, mas vejamos mesmo a beleza exterior a ser elevada”, explicou Lurdes Leal ao Observador.

A Appetence não quer que os utilizadores sejam “apenas uma simples imagem em mais uma dating app“, pode ler-se no site da aplicação. É esse um dos lemas dos três fundadores: os espanhóis Raúl Gilabert, Juan Alonso e a britânica Camilla Forsell. Os três empreendedores perceberam que “o fast dating (encontros românticos que surgem muito rapidamente) fizeram com que muitos homens e mulheres ficassem cansados de não se sentirem especiais”, explicou Forsell em entrevista ao Mashable.

A Appetence pretende evitar o amor à primeira vista para que as pessoas se conheçam bem antes de ficarem iludidas com o aspeto uma da outra. Contudo, a psicóloga Lurdes Leal tem defende que “o amor é sempre à primeira vista, mesmo quando já conhecemos alguém”. E explica: “Há um dia em que redescobrimos essa pessoa. Temos sobre ela um olhar diferente que descobre potencialidades e oportunidades que até aí não tínhamos identificado”.

Na mesma entrevista ao Mashable, Forsell diz que a sociedade atual promove “relacionamentos com laços cada vez mais frágeis” e Lurdes Leal concorda. A psicóloga explica ao Observador que a “aparência é um fator importante no amor”, mas que quando um relacionamento é impulsionado pela aparência, então estamos perante um “amor que é imaturo”.

É como se alguém comprasse uma casa vendo apenas a fotografia do exterior. Habitar um amor é muito mais do que interagir apenas com o interface visual dos parceiros amorosos”, esclarece a psicoterapeuta ao Observador.

Apesar de reconhecer a importância da personalidade, Lurdes Leal acredita que “não basta aquele slogan antigo e em que quase todos nós acreditamos pouco, que é: o que importa é a beleza interior”. A psicóloga clínica conhece bem o valor do aspeto visual e sabe explicá-lo. Mas comecemos por conhecer a Appetence.

Como é que funciona?

A Appetence, disponível apenas para sistemas operativos iOS, funciona com base num algoritmo que combina os utilizadores de acordo com os seus interesses e gostos. Quando se descarrega a aplicação, ainda estamos longe de começar a procurar um candidato a parceiro ou parceira, não porque a app demore muito tempo a descarregar, mas porque é preciso responder a uma série de perguntas sobre a sua personalidade e gostos antes de ficar online e ativo:

Depois da inscrição (através do mail ou do Facebook), seguem-se as perguntas. Primeiro, o sexo.

Depois, a escolha das pessoas que lhe aparecem é feita com base naquilo em que as outras pessoas se interessam, porque, até este momento, ainda não foi revelada nenhuma fotografia. Quanto mais interesses tiverem em comum, maior será a compatibilidade, segundo a Appetence.

Mas não há aquela ideia de que os opostos se atraem? Há, mas a psicóloga Lurdes Leal acredita que tem de haver uma “base de parecença [entre os dois utilizadores], porque não são pessoas profundamente contrastantes que vão constituir pares harmoniosos”. Contudo, isso não significa que quanto maior o número de interesses em comum, maior a probabilidade de “dar certo”.

As pessoas acham que se escolhem porque são muito parecidas, mas é mentira. Vamos à procura de alguém que seja bem diferente, que nos mostre o outro lado da vida, que muitas vezes desconhecemos e que no fundo nos enriquece”, contrapõe a psicóloga.

Quando a aplicação considera que há dois utilizadores compatíveis que se interessam um pelo outro, abre-lhes uma conversa. No início deste chat, as fotos de perfil estão cobertas quase na totalidade por um padrão geométrico. Só são reveladas depois de os dois interessados conversarem durante algum tempo — mais precisamente, cem vezes. A contagem é feita com base no número de gostos que cada um faz às mensagens recebidas. Assim, é preciso que cada um goste de 50 mensagens do outro. Quanto mais conversarem, mais interesses vão sendo revelados, bem como a fotografia.

Se não chegar sequer à fase da conversa porque apareceu a mensagem “Parece que não há ninguém por perto”, isto não significa que não exista um utilizador compatível consigo. Na verdade, a Appetence é uma aplicação muito nova no mercado e segundo aquilo que o Observador pode apurar quando testou a app, ainda com poucos utilizadores em Portugal.

Separar a beleza interior da exterior é boa ideia?

Apesar de a Appetence ter um conceito diferente de outras dating apps, a base é a mesma: o aspeto da pessoa é algo que aparece separado da sua personalidade. A psicóloga Lurdes Leal defende que, neste tipo de aplicações, acabamos sempre por ter uma “caricatura da pessoa” porque “ou apostamos num todo, ou caímos numa armadilha”.

É muito importante a personalidade, mas também é importante a forma como nós a embalamos por fora. Temos de definir o nosso valor não só por uma coisa nem só por outra, mas por um conjunto equilibrado que incorpore e sintetize o interior e o exterior”, esclarece a psicóloga.

A Appetence, apesar da diferença que marca, é mais outra de muitas no mercado de aplicações de encontros que tem vindo a crescer nos últimos anos. Para a psicóloga, não são as aplicações que são boas ou más mas a utilização que fazemos delas. E alerta que é preciso ter uma “responsabilidade individual” de gestão de “expectativas”. Se a app for usada com o “intuito restritivo de ter relações sexuais, a aparência vai ser o critério exclusivo de seleção”. Pelo contrário, se o objetivo é encontrar um relacionamento de longa duração, “a aparência vai ser só um dos critérios, entre outros”.

É preciso que as pessoas saibam o que receberam da aplicação para não se dececionarem e não caírem em embustes que lhes vão sair emocionalmente caros”, alerta a psicóloga.

Lurdes Leal defende que este tipo de aplicações são uma “oportunidade para as pessoas combaterem alguma solidão”. Por isso mesmo, alerta para uma “responsabilidade acrescida de perceberem que há uma idealização” que é feita da outra pessoa e que esta idealização “é muito mais difícil de combater quando estão de uma forma virtual na vida umas das outras”.

*Texto editado por Ana Pimentel

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