www.dinheirovivo.ptLuís Bravo - 20 ago. 18:01

Anatomia de um milagre

Anatomia de um milagre

Apenas a manutenção do ímpeto reformista consegue garantir a competitividade e o equilíbrio social suficientes para transformar o país.

Vale a pena reformar. É a conclusão que se pode retirar dos números recentes divulgados para Portugal, e que têm ganho maior dimensão por um comportamento fora do comum do turismo, que vale hoje 7% do PIB e que, em 2016, já terá contribuído de forma direta num mínimo de 1% para o crescimento económico.

Os analistas da Capital Economics, por exemplo, acreditam que o impacte total (direto e indireto) do turismo pode atingir para Espanha e Portugal um valor de 16% a 18% do PIB, beneficiando das tendências geopolíticas internacionais, mas também do sólido empenho que foi colocado nesta área durante a intervenção externa.

Foi também durante a troika que se procederam a algumas mudanças importantes na estrutura laboral (em 2012), que se traduziram em maior ganho para competitividade para as empresas, mas também num ciclo de queda do desemprego. Também foi importante a manutenção do trajeto de consolidação de contas públicas, que retirou o país do processo por d��fice excessivo.

Mas foi sobretudo crucial a manutenção do programa de estímulos do BCE, a par da recuperação das principais economias europeias, importantes parceiros comerciais. O programa de quantitative easing permitiu que Portugal passe desde 2015 pelos “pingos da chuva” do escrutínio dos mercados, enquanto acumula mais dívida (que atinge agora 250 mil milhões de euros). A intervenção do BCE, juntamente com taxas de juro muito reduzidas, permite que Portugal pague muito menos pelo financiamento do que seria a realidade de um país que está fora das notações de rating de investimento, ou seja, acima de “lixo”.

É esta a anatomia do milagre português. Uma conjugação entre o bom (herança das reformas e explosão do turismo), o mau (austeridade com cativações duras e impostos altos) e o vilão (elevado endividamento e programa de estímulos do BCE). Tão grande é a ilusão do milagre, quanto pode ser a ilusão de que as fragilidades estruturais desapareceram. O nível de dívida só é sustentável enquanto houver estímulos e juros baixos na Europa; a consolidação fiscal não é sustentável se depender eternamente de duras cativações; e os impostos altos apenas criarão uma sociedade viciada e estatizada, incapaz de criar valor e com custos elevados para angariar financiamento privado e segurar capital humano. Aí sim, poderemos falar de milagre mas também de sucesso.

Managing Partner da Dif Broker

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