expresso.sapo.ptexpresso.sapo.pt - 25 jun. 12:31

Assunção Cristas: “Fiquei muito feliz por ver o CDS viabilizar a lei das quotas”

Assunção Cristas: “Fiquei muito feliz por ver o CDS viabilizar a lei das quotas”

Defensora da nova lei de quotas de género para as empresas públicas e cotadas em bolsa, Assunção Cristas defende que a igualdade de género também é uma matéria importante para os centristas

Foi a única, à direita, a bater palmas depois de a lei de quotas de género ter sido aprovada esta sexta-feira no Parlamento. Uma imagem rara para um líder do CDS. Assunção Cristas, mãe de dois rapazes e de duas raparigas, disse desde o início que era por causa deles que apoiava a lei, proposta pelo Governo. “Hoje, precisamos de quotas para defender as mulheres. Se um dia precisarmos delas para defender os homens, eu lá estarei”, escreveu num artigo de opinião no “Correio da Manhã”, a dois de março. Um dia depois da aprovação da lei, falou ao Expresso, em Bruxelas, onde participou numa conferência sobre igualdade de género, “Matiné Pensante - Portugal no feminino”.

A nova lei destina-se às empresas públicas e às empresas cotadas em bolsa, e pretende que a partir de 2018 estas fiquem obrigadas a cumprir uma quota mínima do género menos representado nos conselhos de administração e nos órgãos de fiscalização. Assim, pelo menos 33,3% terão de ser ocupados por mulheres. Para as cotadas, esse mínimo é de 20% e sobe para os 33,3% em 2020. Foi o CDS que negociou, na comissão parlamentar, a nova lei com o Governo e com o PS, suavizando as multas e sanções da proposta inicial. A presidente do partido elogia a deputada Ana Rita Bessa, que encabeçou essas negociações, e lembra que a paridade está relacionada com a natalidade, um tema caro dos centristas.

Há quanto tempo apoiava as quotas?
Acho que, sem nunca me debru��ar muito especificamente sobre esse assunto, quando entrei para o CDS já era a favor. Mas sabia que o CDS era contra. Lembro-me de conversarmos sobre isso, sempre fui defensora de um regime de quotas. Na política deu bons resultados - e certamente dará mais - e quando se começou a discutir para as empresas, ao início, tinha algumas dúvidas, mas com os anos e ao observar uma evolução muito, muito lenta, e olhando para os resultados na política, achei que fazia sentido uma pressão legislativa para que as coisas pudessem evoluir mais facilmente.

Foi difícil negociar este diploma com o Governo e com o PS?
Não. Adoptámos uma postura desde o início, apesar de depois não ter sido bem assim, que era a de que tínhamos mais deputados no CDS contra do que a favor. Mas também optámos por uma postura construtiva e vontade de contribuir em alguns aspectos, em que achámos que se podia ir por um caminho mais gradual. A partir do momento em que entrámos num caminho de corrigir alguns aspetos que levariam as pessoas a aderir um bocadinho mais a esta linha legislativa, foi fácil. A nossa deputada Ana Rita Bessa fez um trabalho extraordinário, agarrou neste assunto. Ela que inicialmente até era resistente à matéria, envolveu-se, empenhou-se e fez propostas muito significativas e relevantes. Até que, do outro lado, percebemos que também havia uma postura construtiva e vontade de acolher as nossas propostas. Costumo dizer que não há processos difíceis quando, à partida, as pessoas têm uma vontade de chegar a determinado espaço. Sempre dissemos que íamos tentar melhor, mas que não haveria disciplina de voto. Contudo, também tínhamos a consciência que se alguma coisa mudasse, alguns deputados poderiam também mudar o seu sentido de voto. E assim aconteceu. Fiquei muito feliz porque sou militante da causa. E porque, sabendo que não era essa a posição dominante do partido - e eu nunca a quis impor - ver que o grupo parlamentar ajudou a viabilizar o projeto.

A imagem que marca esse dia é a sua, sozinha, à direita, de pé a bater palmas. É estranho uma líder do CDS defender um tema que tem sido bandeira da esquerda.
Quando entrei para o CDS, a primeira coisa que o Paulo Portas me mandou fazer foi um relatório sobre natalidade e eu coordenei um grupo sobre isso. Ao estudar os outros países, uma das áreas que identifiquei como tendo sido de progresso em matéria de natalidade, pela linha da conciliação entre trabalho e família, foi a área da igualdade de género nos países nórdicos. Lá, a queda brutal da natalidade pôde ser invertida com políticas de igualdade de género. Está muito ligada à questão da conciliação familiar, da organização dos papéis, da divisão de tarefas. Lembro-me de que quando apresentei o meu relatório no Conselho Nacional, as pessoas acharam estranho este léxico... o CDS a falar de igualdade de género! Como vinha da academia e de fora dos partidos, só pensava - “mas porque é que não há de ser também uma expressão nossa? O que há de distante para que não nos possamos aproximar e apropriar destas questões quando há uma questão tão próxima - com um tema muito caro ao CDS - que é o da natalidade e da conciliação trabalho-família?”. Foi muito por essa via, por ter percebido a eficácia que tinha tido no terreno, que sempre adotei a lógica da igualdade de género, que antes assumia como sendo uma coisa comum e não de património do partido. Depois, percebi que causava alguma estranheza, mas sempre mantive a minha posição, sabendo que para muitas pessoas era uma coisa estranha. É um caminho que se vai fazendo. Fiquei muito feliz por saber que muitas pessoas se iam revendo nisto. Tenho de fazer a justa homenagem ao trabalho da Ana Rita Bessa e dizer que foi bom que o CDS se tenha empenhado e que do outro lado tenha havido acolhimento. Isso também é importante. Quando há este espírito recíproco, as coisas podem acontecer.

Está envolvida em várias frentes. Uma mulher líder de um partido tem de provar mais?
Acho que trabalhamos todos muito. Trabalho muito, mas só sei trabalhar assim, muito em todas as coisas. Acho que é uma questão de feitio, tudo o que posso fazer, faço. Quando não tenho trabalho, invento. Não acho que seja por ser mulher. Quando me doutorei, quis ficar em exclusivo como professora na faculdade, porque tinha tido um tempo muito intenso antes. A dada altura já fazia, para além das aulas e dos colóquios, quinhentas outras coisas, e já tinha o tempo todo tomado. Só sei fazer assim, onde estou dou o máximo que posso dar.

Na política, as mulheres não têm de trabalhar mais que os homens?
Não sei. Não tenho esse comparativo. Dedico-me pouco a avaliar o que os outros fazem, dedico-me mais a auto-avaliar-me. Tenho um caminho muito claro e focado, trabalhando em equipa e motivando os outros. E estando onde posso estar.

Foi a primeira ministra grávida. Tirou a licença de maternidade e voltou ao trabalho. Sente-se uma imagem da igualdade de género?
Não tenho uma visão minha como imagem do que quer que seja. Para mim, as coisas são muito naturais. Num certo sentido, fiquei muito surpreendida quando a gravidez foi notícia. E deu tanto que falar. Estive grávida e trabalhei, antes de ser ministra, três vezes. Era a minha quarta gravidez. Quando comecei a fazer o doutoramento, achei que só ia começar a ter filhos depois da tese, porque aquilo era algo muito absorvente. Depois de ter estado uns tempos em Hamburgo, completamente dedicada a ler, a investigar e a tirar fotocópias, pensei - “isto vai demorar imenso tempo e é uma coisa pobre se eu não fizer mais nada na minha vida pessoal e familiar”. Lembro-me perfeitamente de ter telefonado ao meu marido a dizer isso. O doutoramento era o meu trabalho e se as outras pessoas que tinham trabalhos absorventes também podiam ter filhos, então eu também podia. E sempre achei que as gravidezes foram uma forma de trabalhar mais e mais rapidamente, porque impunham deadlines. Fui sempre partilhando tarefas com o meu marido. Pensei - “se agora o meu trabalho é estar no Governo e ser ministra, e se antes já trabalhava e também conciliava, agora também o posso fazer”.

NewsItem [
pubDate=2017-06-25 13:31:47.0
, url=http://expresso.sapo.pt/politica/2017-06-25-Assuncao-Cristas-Fiquei-muito-feliz-por-ver-o-CDS-viabilizar-a-lei-das-quotas
, host=expresso.sapo.pt
, wordCount=1289
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2017_06_25_47056979_assuncao-cristas-fiquei-muito-feliz-por-ver-o-cds-viabilizar-a-lei-das-quotas
, topics=[política]
, sections=[actualidade]
, score=0.000000]