www.dn.ptdn.pt - 25 jun. 01:59

Guerra - EUA desafiam Putin no Leste da Síria

Guerra - EUA desafiam Putin no Leste da Síria

Americanos multiplicam ações militares contra as forças de Assad sob pano de fundo da batalha pela conquista de Raqqa

O derrube de um avião de ataque sírio em ação perto da cidade de Tabqa, na província de Raqqa, por um F/A-18E Super Hornet americano, há uma semana, veio uma vez mais ilustrar o empenho de Washington em assumir o controlo das ações militares no leste da Síria e em negar a área à ação das forças de Damasco.

Responsáveis militares americanos justificaram o ataque garantindo que o aparelho, um caça-bombardeiro Su-22, estava a atacar unidades das SDF (Syrian Democratic Forces), uma coligação de milícias curdas e árabes patrocinada pelos Estados Unidos. Moscovo reagiu de imediato ao incidente ameaçando passar a tratar os aparelhos americanos em ação na área como elementos hostis e anunciando o corte das comunicações diretas com o comando americano.

O derrube do Su-22 sírio surge na sequência de uma série de ataques americanos às forças fiéis ao regime de Damasco no último mês, em particular no leste da Síria.

No início de junho os EUA derrubaram um drone sírio perto de al-Tanf, na fronteira sírio-iraquiana. Em maio aviões americanos bombardearam um comboio de forças sírias que se estariam a aproximar de uma base usada por milícias rebeldes e por forças especiais americanas. E em setembro do ano passado aviões americanos que atuavam contra posições do Estados Islâmico (EI) atingiram "por erro" tropas sírias matando dezenas de soldados.

Tudo isto sob o pano de fundo do assalto das forças curdas e árabes coordenadas pelos EUA a Raqqa, a capital de facto do califado proclamado pelo EI em 2014 e, ao mesmo tempo, de uma batalha pelo controlo futuro do território do leste da Síria. As forças pró-governamentais sírias vêm-se excluídas do assalto a Raqqa mas estão a conquistar terreno ao EI na área a sudoeste da cidade.

Um aviso a Teerão

As ações americanas visam ainda, em última análise, alvos mais distantes. O derrube de um drone de fabrico iraniano operado por forças sírias no sul do país, um dia depois do abate do Su-22, e os ataques a unidades sírias com uma forte presença iraniana conformam o que parece ser um aviso a Teerão.

Desde a campanha para as presidenciais de novembro último, Donald Trump prometeu endurecer posições face ao Irão e denunciar o acordo nuclear com Teerão negociado sob a Administração de Barack Obama. Altos responsáveis da Casa Branca apontaram repetidamente o Irão como uma séria "ameaça estratégica" aos interesses americanos. E os apelos do reeleito presidente Hassan Rouhani a um diálogo reforçado com os líderes europeus foram acolhidos com irritação em Washington.

A hostilidade a Teerão marcou forte presença na primeira deslocação do novo presidente americano ao Médio Oriente, em maio, e parece ser o elemento aglutinador daquilo em que os observadores veem uma coligação entre Israel, a Arábia Saudita e outros Estados do Golfo. A questão não terá sido igualmente alheia aos esforços da Arábia Saudita, com o aparente beneplácito de Washington, para ostracizar o Qatar, bem como às duríssimas exigências avançadas há dois dias por Riade ao regime de Doha.

A influência do Irão no Iraque e na Síria representa um fator de peso na hostilidade de Washington. Milícias e conselheiros militares iranianos têm dado um apoio importante ao esforço de guerra do regime de Bagdad contra o Estado islâmico. E os grupos de milícias apoiados pelo Irão, entre eles o Hezbollah, têm dado um contributo de peso à capacidade militar do regime de Damasco. Teerão procura assim capitalizar o apoio ao regime de Assad para aumentar a sua influência dentro da Síria.

Situação de alto risco

As ações militares americanas na Síria representam por outro lado um desafio à Rússia, um dos principais apoios do regime de Damasco.

O Ministério da Defesa russo reagiu ao derrube do Su-22 sírio declarando que os aviões da coligação liderada pelos EUA que voem a leste do rio Eufrates serão seguidos pela antiaérea russa e tratados como alvos potenciais. Moscovo suspendeu ao mesmo tempo uma linha de urgência estabelecida para evitar o risco de choques entre aparelhos russos e americanos que operam nos céus da Síria.

Essa via de comunicação tinha já sido suspensa no início de abril, depois de um ataque americano à base aérea de Shayrat mas as duas partes restabeleceram a linha direta em maio.

Ao mesmo tempo, uma série de mísseis disparados na sexta-feira contra posições do EI a partir de navios estacionados no Mediterrâneo parecem assinalar a disposição russa de responder aos ataques americanos contra as forças de Damasco.

A situação coloca ao mesmo tempo em causa o apoio russo ao presidente Bashar al-Assad. O secretário de Estado americano, Tex Tillerson, acusou prontamente o regime sírio de ser responsável pelo alegado ataque com armas químicas na província de Idlib, no início de abril, e declarou que Assad já não tinha qualquer futuro como líder da Síria, instando Moscovo a "repensar cuidadosamente" o apoio o regime de Damasco. Isto, dias depois de a Casa Branca ter abandonado a exigência do afastamento do presidente Assad como condição para qualquer solução na Síria. A viragem na política da Administração Trump cortava assim o passo a quaisquer expectativas de uma saída política para a crise síria no quadro atual.

A diplomacia russa está a negociar com a Turquia, o Irão e a Síria o estabelecimento de "zonas de segurança" (safe areas) na Síria para garantir condições para um cessar-fogo no quadro das negociações em curso na capital cazaque, Astana. Moscovo tem multiplicado contactos com a Casa Branca para conseguir o apoio dos EUA. Washington dificilmente aceitará, porém, qualquer solução política capaz de contar com o apoio de Moscovo e Teerão.

Para já, o leste da Síria tornou-se palco de uma tensão crescente entre Washington, Teerão e Moscovo. Uma situação em que a linha de urgência entre americanos e russos poderá não ser bastante para prevenir em absoluto o risco de um incidente militar de consequências imprevisíveis.

NewsItem [
pubDate=2017-06-25 02:59:00.0
, url=http://www.dn.pt/mundo/interior/eua-desafiam-putin-no-leste-da-siria-8588706.html
, host=www.dn.pt
, wordCount=955
, contentCount=1
, socialActionCount=0
, slug=2017_06_25_439385711_guerra--eua-desafiam-putin-no-leste-da-siria
, topics=[estado islâmico, mundo, guerra, guerra na síria]
, sections=[actualidade]
, score=0.000000]