www.dn.ptAntónio Barreto - 25 jun. 02:12

Sem Emenda - Um Parlamento trivial

Sem Emenda - Um Parlamento trivial

A Agência Europeia de Medicamentos poderá vir para Portugal! A saída da Grã-Bretanha da União tem consequências destas. Organismos estabelecidos no Reino Unido serão deslocados. Dezenas de empregos apetecíveis serão criados noutros países. Muitos funcionários sairão de Inglaterra. Centenas de funcionários britânicos deixarão Bruxelas, Estrasburgo, Luxemburgo e outras localidades onde existem representações. Em vários países, por efeitos do despedimento de britânicos, abrirão vagas e empregos. Percebe-se. É uma maneira de castigar os irreverentes e de favorecer os disciplinados. Também é verdade que mal se compreenderia que uma agência não estivesse sediada num país membro. Cargos até hoje ocupados por ingleses ficarão acessíveis à competição: muitos são os técnicos e os cientistas, indivíduos e empresas, que se preparam para colher os despojos. Uns casos serão decididos por mérito e concurso, outros pela família ou o partido.

Há, na União, dezenas de instituições que desempenham funções importantes e beneficiam de elevados orçamentos e de quantidades de pessoal qualificado. Todos os países querem ter organismos destes dentro das suas fronteiras. Os mais poderosos conseguem os melhores. Uma dúzia de países lançou-se atrás da Agência de Medicamentos. A sede fica num prestigiado centro de edifícios modernos, em Canary Wharf, Londres. Trabalham lá 800 funcionários de elevada competência técnica. O organismo tem a tutela, por assim dizer, de umas dezenas de instituições nacionais que tratam dos medicamentos e das indústrias farmacêuticas.

Já há 18 candidatos, entre os quais Barcelona, Paris, Amesterdão e Milão. Assim foi que o governo e o Parlamento decidiram candidatar Lisboa à localização da agência. Tudo corria bem, até que surgiu a polémica. Então e o Porto? A resolução votada no Parlamento era explícita: Lisboa! Os deputados não viram. Ou não se deram conta. Ou não perceberam. Ou foram obrigados a mudar de posição. Algo aconteceu. Os chefes partidários, os deputados de várias cidades e os organismos locais dos partidos acordaram! Pensaram nas autárquicas. Na descentralização. Nas regiões. Uns mudaram de opinião e disseram, outros mudaram e não disseram, outros ainda não mudaram... Dias depois, com o coração apertado pelas autárquicas, o governo decidiu reabrir a hipótese de outras cidades, isto é, do Porto. E até o primeiro-ministro afirma que foi enganado! Sobra a questão: o que se passou para que uma unanimidade fosse posta em causa em tão poucos dias por tanta gente? Como foi possível?

Pense-se num dia de votações no Parlamento. Veja-se como aquilo funciona e percebe-se que tudo é possível. São listas de votações automáticas, umas seguidas às outras, para que ninguém falte e não haja surpresas. A música é conhecida e vê-se bem no Canal Parlamento. Resolução número tal, projecto de lei número tanto, proposta disto e daquilo, quem vota contra, quem aprova, quem se abstém, está aprovado pelos partidos tal e tal, rejeitado pelos partidos assim e assado. Quando o presidente pergunta quem vota a favor e contra, de cada grupo levanta-se um senhor ou senhora, é como se todos se levantassem, não há indivíduos nem pessoas, não há deputados nem representantes, há unidades colectivas, regimentos e claques. Voto sindicado e obediente. Vota um por todos.

As minhas fotografias

São Judas Tadeu: votos, promessas e graças Fotografia dos anos 1970, na Sé de Braga (ou será no santuário do Sameiro?), com a guerra de África bem presente. É um santo antigo, foi apóstolo de Cristo, com quem consta ser muito parecido, diz-se mesmo que era seu primo. Não deve ser confundido com Judas Iscariotes, o "apóstolo traidor", o do "beijo de Judas". Era irmão de Tiago. Mártir, foi assassinado com outro apóstolo, Simão, por terras da Pérsia. É o "santo das causas perdidas" ou das "causas impossíveis". Ao que parece, escrevia muito bem. Tem carta publicada na Bíblia. Pode encomendar-se-lhe muita coisa em Portugal, tantas são as causas difíceis. Ou mesmo desesperadas. Talvez a causa das florestas, cujo patrono poderia ser ele. Na sua carta, alude às "nuvens sem água arrastadas pelos ventos" e às "árvores de Outono sem fruto, duas vezes mortas e arrancadas pela raiz"...

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