visao.sapo.ptvisao.sapo.pt - 25 jun. 09:00

Um guia para explorar o Portugal selvagem

Um guia para explorar o Portugal selvagem

Longe dos empreendimentos turísticos, além da costa, há praias fluviais, registos históricos, marmelada caseira. Uma inglesa e uma portuguesa fizeram três mil quilómetros, tudo fora da autoestrada, para mostrar o melhor de nós

Não há quem cumpra o Caminho de Santiago sem voltar de lá com uma revelação. Para Edwina Pitcher, jornalista e fotógrafa, de 31 anos, a descoberta foi a beleza – intocada – de Portugal. Era a primeira vez que a inglesa punha os pés no nosso país, um ponto de partida para a sua peregrinação. Não tinha motivação religiosa. Queria refletir, pensar na vida, caminhar. Demorou um mês a percorrer os 600 quilómetros de Lisboa a Santiago de Compostela. E teve uma ideia que chegou com força e muita certeza: era preciso fazer um guia de viagem que mostrasse este Portugal fora da costa, distante dos empreendimentos turísticos. “Um lugar mágico, onde o tempo não existe”, define Edwina, à VISÃO.

Contactada a editora inglesa, Wild Things Publishing, não foi difícil vender a ideia. Só que a primeira proposta era a de se fazer um guia de locais para nadar, em Portugal. Redutor, pensou a jornalista, especializada em “escrita de natureza”. Com um entusiasmo a toda a prova e fotos à altura, Edwina convenceu a conhecida editora de viagens de que o país merecia um volume na coleção Wild, mais abrangente, com espaço para a história, os caminhos pedestres, a gastronomia.

Mas para se fazer à estrada, precisava de ultrapassar dois obstáculos: não tinha carta de condução e não falava uma palavra de português. Foi então que se lembrou de uma amiga portuguesa, que tinha conhecido em Londres, de onde é natural. Diana Matoso, 36 anos, designer e artista, que cresceu no campo e teve uma infância algo nómada, transformou-se na companhia ideal. Como bónus, veio equipada com um jipe vermelho-sangue, emprestado pela avó.

Para a preparação do trabalho, Edwina socorreu-se sobretudo do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, para uma primeira seleção dos locais a visitar. Mas as verdadeiras pérolas vieram sobretudo das sugestões dos habitantes das terriolas por onde andaram. Meteram conversa nos cafés, pararam para falar com os pastores. Até se sentaram com uma turma de um curso de hotelaria para recolher informações sobre o Portugal genuíno.
A 1 de maio de 2015, a dupla fez-se à estrada. Começaram em Arouca, debaixo de uma tempestade de meter medo. Mas nem isso afetou o deslumbramento perante aquela região, classificada como parque geológico. Está no “Top 3” das duas viajantes. Na primeira semana, Edwina obrigava Diana a parar de cada vez que encontravam uma cabra ou uma vaca. “Cresci em Londres, tive uma infância completamente citadina. Sempre tive o sonho de pegar numa cabrinha ao colo” – sonho realizado na serra do Alvão.

Todo o trabalho foi sendo feito ao longo de dois anos. Um mês na estrada seguido de uma paragem para digerir a informação, selecionar as fotos, editar as informações sobre locais para comer e dormir.

Nem as cobras mordem

Escrito em inglês, na lógica de guia de viagens, não sobra muito espaço para contar as aventuras por que as duas amigas passaram. Dormiram dentro de castelos, debaixo de dólmenes com milhares de anos, mergulharam em águas geladas em pleno novembro (ou melhor, só Edwina: “Tinha de experimentar para poder descrever”). Completamente deslumbrada pelo País, a ponto de ter vindo viver para cá e de, entretanto, ter aprendido a falar português, Edwina realça a riqueza histórica, a acessibilidade. “Não é como em Inglaterra, em que tudo é pago. Aqui há muita coisa acessível a custo zero. Não é preciso um grande orçamento para viajar cá dentro.” Diana Matoso também admite ter sido, ela própria, surpreendida várias vezes: “Há uma grande diversidade em pouco espaço. Num raio de vinte quilómetros podemos ver montanha, praia e rio.”

As duas companheiras de viagem também realçam a grande segurança que sentiram ao longo dos três mil quilómetros de viagem – todos sem pôr as rodas numa autoestrada, sublinha Edwina. “Éramos duas raparigas a andar em caminhos de cabras, estradas nacionais e a fazer campismo selvagem, e não nos aconteceu absolutamente nada.” O maior perigo que enfrentaram foram os vidros partidos. No capítulo das aberrações, que se destacam por serem raros, está a anta caiada e o caminho que leva a um dólmen muito bem acimentado.

Quando os amigos lhe pedem recomendações, Edwina sugere o Centro e o Norte do País, pelos rios e passeios de montanha – Coimbra, Arganil, Viana do Castelo – ou o Alentejo pelas estradas romanas e o céu noturno. “Os meus amigos queixam-se que, com a publicação do livro, o que eram segredos bem guardados vão ficar expostos e podem estragar-se. Mas o que nós pensamos é que quem procura este tipo de turismo, ligado à natureza, não vai danificar o património”, justifica Diana. “Fomentar as visitas também é uma forma de ajudar à preservação”, complementa Edwina.

E há sugestões para todos os gostos, no guia Wild Portugal (€19 a edição em papel, €9 a digital). De parques de campismo, a hotéis com spa, de tascas a restaurantes com guardanapos de pano. “É para pessoas que apreciem turismo relacionado com a natureza. Mas não t��m de ser atletas ou desportistas”, refere Edwina. Nota-se um esforço de diversificação de opções. 
“A pessoa pode gostar de fazer uma caminhada ou de nadar no rio, mas querer chegar ao fim do dia e tomar um bom banho de água quente e dormir numa cama fofa”, reforça a autora. Um ponto de partida para a aventura.

Artigo publicado na VISÃO 1264 de 25 de maio

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